quarta-feira, 3 de março de 2010

Dom Helder: uma história de amor (parte II)

Por sua intensa atuação na luta pelos direitos humanos, pela justiça social e contra o autoritarismo, Dom Hélder Câmara entrou em choque com a ditadura militar.

Recém-empossado arcebispo de Olinda e Recife, divulgou um manifesto apoiando a ação católica operária na Capital pernambucana, sendo considerado comunista e virando persona non grata no governo.

Proibido de falar no Brasil, Dom Hélder começa a realizar conferências e pregações no exterior. O cerco do regime autoritário se fechou ainda mais quando, pela primeira vez, denunciou ao mundo a tortura a presos políticos no Brasil, num discurso em Paris, em 1970.

O religioso ficou então impedido de se expressar na mídia e teve até a citação do seu nome vetada nos meios de comunicação, no período de 1970 a 1977. Dom Hélder era impedido inclusive de responder acusações contra ele veiculadas pela imprensa.

Antes disso, na tentativa de calar o “arcebispo vermelho”, vários atentados foram cometidos. Em outubro de 1968, homens metralharam sua residência, na Igreja das Fronteiras, no bairro da Boa Vista. Dias depois, a casa de Dom Hélder voltou a ser alvo de tiros, desta vez de revólveres.

"Dom Hélder enfrentou generais presunçosos, vaidosos. E enfrentou com maneira muito firme um desses generais, que foi convidá-lo para celebrar uma missa de 31 de março. Ele, naturalmente, não aceitou. O general disse ‘eu não vim convidar, eu vim celebrar’. Ele levantou-se e disse: ‘senhor general, cresça e apareça. O senhor não me conhece’”, conta Padre Edvaldo, pároco de Casa Forte.

Mas o pior golpe contra o religioso veio no dia 27 de maio de 1969, quando o padre Antônio Henrique Pereira da Silva Neto, seu auxiliar na Arquidiocese, na área de assistência à juventude, foi encontrado morto, com indícios de tortura.

Padre Henrique por vezes encontrava-se com estudantes cassados e já havia recebido ameaças de morte por telefone, a maioria do Comando de Caça aos Comunistas (CCC). O sacerdote foi amarrado, arrastado e recebeu três tiros na cabeça.

Na missa de corpo presente concelebrada na Matriz do Espinheiro, no dia 28, com a participação de 40 sacerdotes e centenas de jovens, Dom Hélder afirmou que eles não ficariam órfãos.

Cerca de 20 mil pessoas acompanharam, a pé, o caixão, no trajeto da Igreja até o cemitério da Várzea. O cortejo foi interceptado pela Polícia Militar, que recolheu as faixas denunciando o assassinato. No percurso, foram presos o deputado federal cassado Osvaldo Lima Filho e um soldado do Corpo de Bombeiros, amigo da família da vítima, que ajudava a levar o caixão.

Baseado no depoimento de uma testemunha, Rogério Matos do Nascimento, ex-estudante e sem profissão, foi denunciado pelo crime. Mas o caso nunca foi de fato esclarecido. E, até hoje, é atribuído às forças de repressão, numa clara tentativa de calar o “pregador da liberdade”.

Apesar de o governo ainda não ter oficializado a censura à imprensa nesta época – o que fez através de decreto-lei no início de 1970 - os jornais foram proibidos de noticiar o assassinato. No final deste ano, o governo determinou que todos os veículos de comunicação ficavam proibidos de sequer mencionar o nome de Dom Hélder.

“De ordem do Sr. Ministro da Justiça, ficam proibidas quaisquer manifestações, imprensa falada, escrita e televisada, contra ou a favor de Dom Hélder Câmara. Tal proibição é extensiva nos (sic) horários de televisão reservados à propaganda política.”

O silêncio imposto ao arcebispo durou sete anos, sendo rompido em julho de 1977, quando foi publicada, no Jornal do Brasil (Rio de Janeiro), uma entrevista com Dom Hélder.

CONTRA-CAMPANHA
No ano de 1972, Dom Hélder Câmara teve o nome indicado ao Prêmio Nobel da Paz. O Governo Médici realizou então uma campanha contra a eleição do arcebispo, divulgando na Europa um dossiê que o acusava de ser comunista, impedindo a premiação.

Mas o reconhecimento ao trabalho humanitário do arcebispo veio através de vários outros prêmios. O primeiro título foi concedido em 1969, de Doutor Honoris Causa pela Universidade de Saint Louis (EUA). O mesmo título foi recebido de várias outras universidades, em países como Bélgica, Suíça, Alemanha, Holanda, Itália, Canadá e Estados Unidos, além do Brasil.
Foi intitulado ainda Cidadão Honorário de 28 cidades brasileiras e da cidade de São Nicolau, na Suíça, e Rocamadour, na França.
Recebeu também o Prêmio Martin Luther King, nos EUA, e o Prêmio Popular da Paz, na Noruega, além de muitas outras honrarias internacionais.

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